Ater indígena é destaque na 1ª CNATER
Os
serviços de assistência técnica e extensão rural (Ater) oferecidos pelo
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) aos povos indígenas de todo o país
serão aprimorados. Novas diretrizes estratégicas para esse setor serão
submetidas à apreciação durante a I Conferência Nacional de Ater na Agricultura
Familiar (1ª Cnater) e Reforma Agrária, que acontece em Brasília, entre os dias
23 e 26 de abril. As diretrizes aprovadas serão integradas ao Programa Nacional
de Assistência Técnica e Extensão Rural, o Pronater.
As
orientações encaminhadas à Cnater foram definidas no I Seminário Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural em Áreas Indígenas, realizado de 13 a 15
de março deste ano, também em Brasília. Nesse período, a discussão reuniu
líderes de 26 povos indígenas oriundos de 16 estados brasileiros e
representantes do governo federal e de outras organizações do setor.
A
oportunidade inédita de participar da construção conjunta das futuras ações de
Ater, despertou o interesse até mesmo de agricultores familiares indígenas que
ainda não foram beneficiados pelos serviços de assistência técnica. Como Ary
Pereira Bastos, de 34 anos, conhecido por todos de sua região como Ary Pankará
- nome de sua etnia. Ary saiu do sertão do semiárido de Pernambuco, no
município de Carnaubeira da Penha, para apresentar nacionalmente os anseios dos
6,8 mil indígenas de sua comunidade, que vivem da produção familiar.
“A
gente almeja que a Ater indígena relacione a sabedoria tradicional dos povos
com o seu modo de cultivar a terra. Nós obedecemos a questão do tempo,
relacionado com a natureza. Queremos aliar o conhecimento tradicional com o
conhecimento acadêmico, para que possamos melhorar a produção e a preservação
do meio ambiente, com uma agricultura de sustentabilidade”, revela Ary, que
também é coordenador de Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do
Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) no estado de Pernambuco.
Ele
explica ainda que os indígenas da etnia Pankará estão atualmente entre os
maiores produtores de caju, pinha, banana, goiaba e manga do estado. “No
período da safra da pinha, a gente abastece a Ceasa de Recife (PE), Campina
Grande (PB), Maceió (AL), Aracaju (SE) e a de João Pessoa (PB)”, informa. No
entendimento de Ary, a valorização das tradições indígenas, por meio da Ater,
terá resultados mais abrangentes que os planejados. “A gente observa muito que
os jovens têm saído da comunidade para buscar a vida lá fora.
Acreditamos
que, trabalhando melhor a questão da Ater, os jovens vão permanecer dentro da comunidade
e, acima de tudo, vão fortalecer a questão territorial dentro dos povos. A
gente deseja uma assistência indígena dotada com esse sentimento de
continuidade e sustentabilidade”.
Ter
uma diretriz definida e regulamentada que priorize a contratação dos
agricultores locais para realizar os trabalhos de Ater é uma das 88 propostas
que serão avaliadas na 1ª Cnater. A iniciativa é baseada no conceito do
etnodesenvolvimento, que valoriza os elementos culturais e os aspectos
ambientais e tradicionais de cada cultura indígena, como destaca o assessor
especial para Povos e Comunidades Tradicionais do MDA, Edmilton Cerqueira. “Uma
medida aplicada a agricultores e assentados de modo geral não pode ser,
necessariamente, aplicada aos povos indígenas. Essa população exige um
calendário específico, que considere as manifestações locais, as tradições. Por
uma questão cultural, essas famílias precisam participar e organizar as
atividades em tempos diferentes e adequados. É preciso que o serviço de Ater
dialogue com sua realidade, sua especificidade”, explica Edmilton Cerqueira.
A
união do conhecimento proveniente da tradição e da cultura da comunidade com o
conhecimento acadêmico já é vivenciada pelas 2,5 mil famílias de agricultores
rurais indígenas de Xukuru de Ororubá, no município de Pesqueira (PE). Lá vive
Iran Neves Ordonio, de 33 anos – o Iran Xukuru, que saiu da aldeia em 1993 para
cursar o ensino técnico agrícola na capital Recife, já que nas proximidades não
havia escola com essa modalidade de educação. De 1993 a 2004, conclui a
formação básica, a graduação em agronomia e o mestrado em ciências do solo. Ao
se tornar mestre, retornou à comunidade para auxiliar a produção agrícola
Xukuru. Dois anos após a sua volta, em 2006, a comunidade começou a receber os
serviços de Ater do MDA e Iran se tornou um extensionista – técnico
especializado que presta os serviço de Ater.
Com
27,5 mil hectares, o território Xukuru inclui três regiões geográficas
diferentes: região do agreste, da serra e da ribeira. Por causa disso, a
produção da comunidade é variada. Entre o que é cultivado, é possível
encontrar: hortaliças como coentro, alface e cebolinha verde, frutas e a
produção da “lavoura branca” - milho, feijão e mandioca.
Iran
ressalta que todas as ações implantadas no território da aldeia visam o
fortalecimento da agricultura Xukuru. “Fazemos um planejamento, em virtude de
alguns princípios e valores, como garantir o uso coletivo da terra e o
conhecimento ancestral, e trazemos os elementos que orientam nossas ações para
a agricultura. A gente faz uma reflexão para adequar a política à nossa
realidade, e não nós nos adequarmos à política pública”.
Atualmente,
a maior parte do que é produzido pelos indígenas Xukuru é comercializado para o
Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). O restante é vendido em feiras,
supermercados e no comércio da região, explica Iran, que foi eleito delegado
indígena na conferência estadual de Pernambuco e participará, com direito à voz
e voto, da Cnater.
Os
serviços de Ater indígena oferecidos pelo MDA contam ainda com um núcleo, que
garante aos povos a igualdade do acesso ao direito da Ater no âmbito da
Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Pnater), e com uma
rede de assistência técnica e extensão rural especializada, que usará as
estrategias formuladas no seminário nacional para dar continuidade ao processo
de fortalecimento da rede temática, criada em 2008. Além disso, as atividades
oferecidas pela pasta são desenvolvidas conjuntamente às instituições
coordenadoras de políticas indigenistas, como a Fundação Nacional do Índio
(Funai).
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